Fechei meus olhos em uma fenda fina, sentindo o sal das lagrimas invadirem mais uma vez minha boca, que tremia em sintonia com meu queixo e o resto do meu corpo. Tentava não fazer barulho, continha movimentos e reações à dor. Minha respiração estava lenta e ofegante, o oxigênio parecia pesado e com uma textura ríspida, sentia dor por estar viva. Nunca pensei que um “não te quero mais” doeria tanto. Sempre ouvi o ser humano comentando, escrevendo e chorando sobre essa frase, mas nunca imaginei que pudesse ter tanta força.
Antigo trauma, novo homicídio
janeiro 09, 2009
— Não adianta se esconder, eu te conheço bem, sei dos seus esconderijos— senti meus pés tremerem e baixei a cabeça taciturnamente, contendo as lagrimas e prendendo gemidos entre os dentes. Anestesiando a dor dos cortes e das manchas com a dor do medo, da vergonha, da frustração.
— Apareça, vamos menina, eu conheço bem seus instintos dês de que você saiu da barriguinha linda de sua mãe. — recapitulando, um “não te quero mais”... Do meu pai.
Sempre achei instigante ter uma vida aventurada, sempre procurei os caminhos mais fáceis e cabulei tarefas e obrigações. As drogas fizeram parte de meu cotidiano, mas eu tinha dinheiro, isso não afetava ninguém, só a mim. Ao menos foi o que eu pensei hoje, chegando a minha casa, há menos de 3 horas, com uma garrafa de uísque pela metade e um cigarro na mão. Isso sempre pareceu tão natural, meu pai nunca deu queixas, mas foi tudo diferente..."
— Eu não te quero mais, Lea, você não foi a menina que desejei — eu estava sentada pesadamente sobre o chão, o sangue escorria pelo canto de minha boca e os cortes sobre a pele faziam o mesmo despejar sobre a roupa. Eu sentia meus órgãos se reprimirem, meus pulmões estavam secos e poluídos e meu coração batia em ritmo acelerado. Ele não apenas não me queria mais como filha, ele não me queria viva.
Aprovei alguns chingamentos e resisti a poucos mais tapas, empurrões e facadas leves sobre o corpo. Enquanto engatinhava em um ritmo lento, porém o máximo que meu corpo permitira, em direção ao quarto. Fechei a porta e procurei algum lugar para me esconder, e lá estava eu, de volta ao começo. Ouvindo as chamadas e os passos pesados dele, empurrando o chinelo velho pelo assoalho molhado do chão.
A casa cheirava a bebidas, fumo e morte. E talvez por isso eu tenha me sentindo tão à vontade, parecia com qualquer uma das casas em que eu passava a noite, qualquer uma. Levantei o corpo apoiando em móveis e paredes, manquei até onde ele estava, ele mantinha a faca, que eu havia dado de presente, na mão.
— Estou aqui — traguei um dos últimos cigarros que retirei do bolso, fechei os olhos e senti o metal cortando o ar e imergindo com meu corpo.
— Você foi uma boa menina, Lea, enquanto não matou sua mãe.
A raiva não vinha apenas de um vicio bastardo, mas sim de uma longa história de vida, uma perda sem culpados. Culpa da vida, culpa da morte. Matei minha mãe ao nascer, e acabava com a minha própria vida nessa nova fase. O que mais um pai iria desejar, senão a morte de uma assassina suicida? Amor. Ao completar 14 anos, joguei todo e qualquer bom senso fora, amor, por vingança ele não me deu, eu não tinha, nunca iria retribuir. De uma vingança floresceu o ódio, e o ódio deu origem a morte.
— Será bem recebida no inferno, dou garantia, querida.
Postado por Tamyris Kortschinski. às 18:00
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